AMY GOODMAN: Fala-nos que está a acontecer na Grécia e como se relaciona com o sítio onde estás, Tariq.
Tariq Ali: Bom, Amy, explodiu na Grécia, de forma bastante violenta, como muitos tinham previsto, porque os sindicatos gregos continuam bastante fortes. Sentem que está muita coisa em jogo, e sabem que estas medidas, que não devem nunca ser chamadas de 'reformas', estas medidas anti classe trabalhadora, forem implementadas pelo governo, o nível de vida de um cidadão médio vai baixar. Vão sofrer. E as pessoas estão a questionar, na Grécia e em qualquer outro lugar: “Por que é que nós somos as vítimas? E os cortes nos gastos públicos afecta-nos a nós e não aos ricos? E por que é que os bancos não estão a ser punidos? Numa palavra, por que é que o sistema, o sistema criado pelo neoliberalismo, de desregulação, de legalização da especulação financeira, por que é que não está a ser travado?”
Vimos na Alemanha, ontem à noite, que a coligação no governo sofreu uma derrota pesada nas eleições regionais. E há uma grande pressão sobre Angela Merkel – Angela Merkel, a chanceler alemã demissionária pois perdeu a maioria na Câmara Alta (Bündesrat) e, portanto, não conseguirá implementar as suas 'reformas'. E os Sociais-Democratas, que estão agora na oposição, dizem que o sistema financeiro deve ser meticulosamente reformado. É a declaração mais forte que ouvi de um Social Democrata na Europa. E é uma indicação de que o sistema está numa verdadeira confusão. A razão pela qual a União Europeia está a injectar tanto dinheiro é a de assegurar os mercados e impedi-los que continuar ou prevenir o que está a acontecer em Espanha e Portugal que estão no limiar.
Portanto, os gregos, as pessoas a lutar nas ruas gregas, estão a lutar por toda a Europa. Há alguns dias, puseram uma faixa enorme na Acrópole, o edifício histórico no centro de Atenas, que dizia: “Europa, junta-te a nós”. E se os movimentos europeus de trabalhadores se juntassem, haveria uma mudança séria.
AMY GOODMAN: Tariq, eu quero agradecer-te por te teres estado connosco. Tariq Ali, connosco desde Londres. E agora vamos falar com Mark Weisbrot que está em Washington DC.
Mark, tens escrito sobre a Grécia, seguindo a situação de perto. Qual é a tua análise sobre o que tem acontecido ali e o que é necessário acontecer?
MARK WEISBROT: Bom, penso que o Tariq tem razão no que respeita à injustiça da tentativa de reestruturação da economia baseando-se, como sabes, na severidade para com os trabalhadores e com a maioria da população. Mas existe também uma irracionalidade nisto tudo, mesmo do ponto de vista dos detentores de títulos, do sector financeiro e de todo o sistema porque o que estão a fazer é criar um recessão ainda pior. E isto é deliberado.
A teoria económica que eles estão a usar é designada por “desvalorização interna” porque estão a manter o Euro, e querem mantê-lo, então, o que fazem é criar desemprego suficiente para que os custos salariais baixem e a Grécia se torne competitiva, mesmo mantendo as mesmas taxas nominais de câmbio do Euro. Este é um processo que já dura há bastante tempo, é bastante duro e geralmente não resulta. De facto, as projecções do governo grego dizem que a sua dívida é agora 115% do Produto Interno Bruto (PIB), e se continuarem o programa e este funcionar, então, daqui a dois anos e meio terão uma dívida de 149% do PIB. Isto é verdadeiramente irracional e pode constatar-se a irracionalidade dos mercados financeiros porque estão a exigir mais cortes os quais vão agravar a economia. E o mesmo vale para Espanha, Portugal, Irlanda e Itália, os quase têm problemas semelhantes. Estão todos a ser empurrados para a recessão através deste tipo de programas. É realmente errado.
E, sabes, estive a debater com o ex primeiro-ministro grego, que foi responsável pelas 'reformas' dos anos 90 que prepararam a Grécia para o Euro. E ele acabou por dizer: “Bom, nós não podemos abandonar o Euro porque a Grécia é culturalmente incapaz de gerir os seus próprios assuntos económicos.” Este é o tipo de atitude que tem. E estão a castigar a Grécia. Eu não lhe chamaria salvamento financeiro (bailout); eu acho que eles estão a ser atirados fora de bordo. E estão a fazê-lo, bem, nem sequer é racional do ponto de vista da tentativa de resolver a crise porque estão a torná-la pior e o mesmo na Espanha, Portugal e Irlanda, e também Itália. Portanto, este é um problema que vão ter de resolver e não estão a fazê-lo.
AMY GOODMAN: Queria referir-me a um segmento de uma entrevista que fiz ao primeiro-ministro grego George Papandreou quando estávamos em Copenhaga. Ele estava aí para as conversações sobre as alterações climáticas. Questionei-o quando os protestos estavam justamente a começar.
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AMY GOODMAN: Sr. Primeiro-ministro, falou sobre a economia da Grécia estar actualmente com problemas. Tem havido protestos nas ruas. Que diz o líder a Internacional Socialista ao primeiro-ministro da Grécia sendo que um e outro são o mesmo?
GEORGE PAPANDREOU: Estamos em conversações todos os dias. Nós, digo isto com certeza, por um lado, precisamos de dar a volta à nossa economia. Diria que temos de fazer desta crise uma oportunidade, deslocando-nos para uma economia verde. Precisamos de fazer reformas estruturais importantes porque nós – vejo os problemas fundamentais da Grécia como um Estado em era, tinha muita corrupção, corrupção sistémica, muito clientelismo, ou seja, favores políticos, dinheiro que era destinado a favores políticos. E isto minou o sentido de cidadania e a primazia da lei. Tivemos, portanto, muita evasão fiscal. E isso também...
AMY GOODMAN: A zona Euro, está a falar de sair?
GEORGE PAPANDREOU: Não, não estamos a falar de sair da Zona Euro. Aliás, o Euro ajudou-nos bastante ao afastar aspectos ainda mais negativos da crise, a crise mundial, a crise financeira. Nós somos... nós temos os nosso problemas internos. Estão a tornar-se mais graves devido à recessão financeira internacional porque se tivéssemos um PIB mais elevado, turismo e outras coisas, não estaríamos tão mal nesta situação. Mas sim, temos problemas internos.
Enquanto primeiro-ministro, estou a concentrar-me em concretizar estas mudanças mas através da ajuda àqueles que estão desempregados, àqueles que têm salários baixos, à classe média. Eles não têm culpa desta crise e, portanto, fazer cortes é um caminho difícil mas ao mesmo tempo estamos a assegurar-nos de que nos dirigimos ao crescimento e protegemos os mais desfavorecidos na sociedade.
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AMY GOODMAN: Era o primeiro-ministro George Papandreou quando conversei com ele em Copenhaga em Dezembro. Além de primeiro-ministro é também o líder da Internacional Socialista. Qual é a tua resposta, Mark Weisbrot?
MARK WEISBROT: Bem, mais uma vez, eles estão a fazer cortes. Estão a levar a cabo estas medidas. Se se quer reduzir o tamanho do Estado, que eu duvido que seja necessário, não se faz isso durante uma recessão. Nós não fizemos isso aqui. Existe esse problema, é semelhante ao nível do Estado e dos Governos locais e é uma das razões por que o nosso programa de estímulo, mais uma vez, que é oposto às políticas que estão a ser prescritas para a Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda... O nosso programa dá dinheiro aos estados e aos governos locais para que estes não façam este tipo de cortes. Estávamos longe de ter isto e é uma das razões pelas quais a nossa recuperação é lenta e o desemprego continua alto. Mas ao menos fomos na direcção certa. Estão a dizer a estes países para irem na direcção oposta à nossa e isto é um problema fundamental. Uma vez indo por esse caminho, não se sabe onde se irá parar.
Por exemplo, eles fizeram isso na Letónia e na Estónia. Estes países, a Letónia já perdeu mais de 25% da sua economia e ainda tem uma dura e lenta recuperação pela frente, se recuperar. Uma vez mais, isto não tem sentido económico. E vão ter de mudar isto. Alguma coisa vai ter de ceder.
SHARIF ABDEL KOUDDOUS: Mark, apontaste a experiência dos países bálticos que seguiram as políticas da União Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), como um aviso ao que acontecerá à Grécia no futuro. Explica-nos o que querias dizer.
MARK WEISBROT: É ideia é, como disse, o processo de desvalorização interna. Então, em vez de se tentar crescer e sair da recessão, o que estão a fazer mas não com estímulo suficiente, estão a tentar encurtar a saída. A ideia é encurtar literalmente a economia e baixar os salários e os preços. E isso é porque, claro, na Letónia e na Estónia têm uma moeda vinculada ao Euro, e na Grécia eles têm realmente o Euro. Muita gente escreveu sobre o problema fundamental que é ter países com a Grécia no Euro porque é uma moeda sobrevalorizada para eles. E isso é um problema. É por isso que eles deviam considerar seriamente sair do Euro.
Se a UE, o FMI e o Banco Central Europeu (BCE), que são as partes com quem estão a negociar, não estão dispostos a proporcionar um programa que lhes permita crescer, mas em vez disso estão a dizer-lhe para encolher até ao dia em que a economia mundial os salvará através da procura das suas exportações, ou através de uma grande injecção de capital – o que não está no horizonte, isto é, a UE tem apenas 1% de projecção de crescimento -, portanto, se, de facto, eles não estão dispostos a permitir-lhes crescer e sair da recessão, o governo grego não deveria aceitar, podendo desvalorizar a sua moeda e renegociar a ausa dívida que foi o que a Argentina fez no fim de 2001 e foi bem sucedida. A economia diminui em apenas um quarto e depois cresceu 63% nos seis anos seguintes.
AMY GOODMAN: Finalmente, queria perguntar-te...
MARK WEISBROT: … se há alternativas?
AMY GOODMAN: Sim, rapidamente.
MARK WEISBROT: Bom, uma alternativa é sair do Euro e renegociar a dívida e começar de novo em vez de se arrastarem nisto por anos e acabarem com uma dívida maior do que quando tudo começou.
11 Maio 2010
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