quarta-feira, 4 de agosto de 2010

A sede da liberalização

As lições das crises recentes servem para questionarmos algumas das verdades absolutas que estavam instituídas. Diziam-nos que ao mercado bastava apenas o mercado, mas se não fosse o Estado, o mercado teria sofrido um abalo quase fundacional em 2008.
O artigo de hoje é um exemplo da transposição da ideologia para as situações mais comezinhas da nossa vida. Aliás, é a identificação como um caso concreto, aparentemente de menor importância, pode ter um cunho ideológico muito definido.
Afinal, o Estado, que tinha sido diabolizado ao longo de décadas, foi o salvador do mercado, quando este se consumiu a si próprio. Foi exactamente isso que aconteceu na crise financeira de 2008, quando os bancos foram salvos pelos estados. O primeiro dogma que ruiu é relativo à autosustentação do mercado: verificou-se que o mercado não se auto-regula e, por isso, teve de ser salvo de si próprio. O segundo dogma que ruiu foi o de que o Estado não deveria interferir no mercado.
A desconstrução dos dogmas que referi foram um enorme abalo na ideologia neoliberal. Digamos que foram os esqueletos que saíram do armário e mostraram a falência do neoliberalismo. Um outro dogma em que a teoria liberal se alicerça é o da livre concorrência. Digamos que, de forma indirecta, ficou já afectado com a falência dos anteriores. Mas, devemos notar, a sua base de difusão era muito menos credível. Basta vermos os jornais para, mesmo sem a crise financeira, percebermos que a livre concorrência é uma falácia. Américo Amorim tornou-se o homem mais rico de Portugal à custa de um negócio com o Governo de José Sócrates: exactamente de uma forma que ataca a livre concorrência. Aliás, o trajecto industrial de Américo Amorim demonstra até como ele só conseguiu ficar mais rico à custa de uma brutal diminuição da concorrência no sector corticeiro. E, com apenas este exemplo, se demonstra como a livre concorrência não é nem real, nem sequer uma virtude, dado que aqueles que realmente são valorizados, raramente assumiram essa posição de destaque sem colocarem em causa a livre concorrência. Este é o triunvirato dos dogmas que caiu e de cuja queda não nos podemos esquecer, nem deixar que ninguém se esqueça.
O caso concreto que referi logo no início do texto prende-se com a certificação das instalações de gás e electricidade. Compreendem agora porque referi que este era um tema aparentemente menor na agenda política. Contudo, servirá para ilustrar a forma como a ideologia encontra o dia-a-dia em questões tão comezinhas como estas.
A certificação das instalações de gás e electricidade é a segurança de quem compra uma habitação. Seja num apartamento ou numa moradia, a certificação realizada por uma entidade independente, indicando que a instalação se encontra devidamente efectuada, é uma garantia forte de que não ficará em causa a nossa segurança pela incúria dos construtores. Realço, neste ponto, a necessidade da certificação ser feita por uma entidade independente dos interesses do construtor e, devido a essa independência, seja objectiva e séria na avaliação.
Historicamente, a certificação das instalações era realizada pelas entidades regionais do Ministério da Economia ou pelas empresas distribuidoras. A difusão da ideia de que existia demasiado Estado levou a que nos governos de Cavaco Silva se começasse a preparar o terreno para que as certificações das instalações deixassem de ser realizadas pelas entidades regionais do Ministério da Economia. E, assim, foi sendo aberto o caminho para que privados assumissem as funções que anteriormente eram executadas pelo Estado. No Governo de António Guterres, deixou de existir qualquer interferência das entidades regionais do Ministério da Economia no processo de certificação, passando a ser totalmente executado por privados. Neste ponto, ainda não estavam cumpridos os dogmas neoliberais na sua plenitude: apesar da ausência da presença do estado nestas actividades económicas, as restrições à actividade ainda não permitiam a existência de um mercado liberalizado, obrigando que as entidades certificadoras fossem pessoas colectivas, certificadas e acreditadas. No sector do Gás o mercado era de livre concorrência, mas restrito às entidades promulgadas pela Direcção Geral de Energia e Geologia. O sector da Electricidade tinha restrições muito mais efectivas, existindo apenas três entidades certificadoras distribuídas por zonas geográficas, sem qualquer concorrência entre si.
O passo final neste processo de implantação neoliberal chegou com a tão badalada liberalização do mercado das inspecções. Dessa forma, o Governo de José Sócrates criou um novo sistema de certificação das instalações de gás e electricidade. Os pilares do novo sistema baseavam-se na existência de um termo de responsabilidade por parte do técnico responsável pela execução da obra e na possibilidade das autarquias realizarem inspecções aleatórias às instalações.
Percebe-se, facilmente, o alcance destas medidas: por um lado a pressão sobre os técnicos para assinarem termos de responsabilidade de obras que não cumpririam as regras de segurança; por outro lado, as autarquias, já deficitárias nos seus orçamentos e conhecimento técnico, não realizariam qualquer controlo sobre as instalações e sobre o trabalho dos técnicos. Resultado final: todos nós ficaríamos mais indefesos perante os interesses dos construtores civis.
A preocupação com a segurança não é apenas teórica. O grau de não conformidades na primeira análise de projectos chega aos 80%. O número de projectos que, após a fase de instalação, necessita de correcções atinge os 50%. Estes dados são os bastantes para se perceber a gravidade e o alcance da medida legislativa proposta pelo Governo. Este foi o ponto em que a cegueira ideológica se sobrepôs à segurança dos cidadãos. É também a prova que muitos não tiraram as devidas conclusões da derrota que o neoliberalismo sofreu em 2008, pelo que não podemos deixar de a lembrar.
A resposta que o Bloco de Esquerda teve para com esta situação foi a de, activamente, impedir que a legislação entrasse em vigor. Sendo certo que não secundamos o modelo que actualmente existe, o modelo proposto pelo Governo seria completamente incauto. Assim, entregamos uma apreciação parlamentar sobre a matéria, na qual fomos acompanhados pelos restantes partidos da oposição. Seria de esperar que, face a esta demonstração de força de toda a oposição, o processo tivesse decorrido de forma célere e o governo facilmente saísse derrotado. No entanto, a realidade foi bem mais dura. O PS tudo fez para, administrativamente, atrasar o processo. Este atraso chegou ao ponto de só ter sido concluído o processo da apreciação parlamentar quase três meses depois do seu início. Por outro lado, o peso ideológico das medidas do Governo colocou muitas dúvidas na acção do PSD. Foi de tal forma difícil, que o voto do PSD contra as medidas do Governo só se atingiu quando o debate político saiu das ideias e entrou no carácter dos deputados. Dito de outra forma, a união de ideias do Bloco Central só foi subjugada perante o confronto dos egos pessoais.
A vitória que a oposição conseguiu foi um enorme passo na defesa da segurança dos portugueses, no que às instalações de gás e electricidade diz respeito. Contudo, apenas se venceu uma batalha, estando ainda em aberto o desfecho da guerra. E os argumentos que serviram para esta vitória, como referi, são extremamente débeis, mas, demonstram como a velha máxima de dividir para reinar ainda pode ser aplicada na política.
 

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Comunicado do Bloco de Esquerda sobre a Escola EB2,3 de Minde

Consulte no link abaixo:

Requerimento ao Secretário de Estado do Ambiente

Bloco requereu a vinda do Secretário de Estado do Ambiente

à AR para esclarecer funcionamento da ETAR de Alcanena

O deficiente funcionamento da Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de Alcanena, com mais de 20 anos, tem sido extremamente penalizador para a qualidade de vida e saúde pública das populações deste concelho, além de ser responsável pela poluição de recursos hídricos e solos.

Esta ETAR, destinada a tratar os efluentes da indústria de curtumes, foi desde a sua origem mal concebida, a começar por se situar em leito de cheia. Desde então os problemas são conhecidos e persistem: maus cheiros intensos; incumprimento regular dos valores-limite estabelecidos para o azoto e CQO das descargas de efluente tratado em meio hídrico; célula de lamas não estabilizadas, com deficiente selagem e drenagem de lixiviados e biogás; redes de saneamento corroídas, com fugas de efluentes não tratados para o ambiente; saturação da ETAR devido a escoamento das águas pluviais ser feita nas redes de saneamento.

Desde há muito que estes problemas são conhecidos e nada justifica, ainda mais com todo o avanço tecnológico existente ao nível do funcionamento das ETAR, que se chegue ao final de 2010 com esta situação. E pior se compreende quando é o próprio Ministério do Ambiente a constatar que gastou ao longo dos anos cerca de 50 milhões de euros para tentar responder a estes problemas.

Em Junho de 2009 foi assinado um protocolo para a reabilitação do sistema de tratamento de águas residuais de Alcanena pela ARH Tejo, o INAG, a Câmara Municipal e a AUSTRA (gestora da ETAR), com investimentos na ordem dos 21 milhões de euros de comparticipação comunitária.

Este protocolo inclui cinco projectos, os mais importantes dos quais com prazo final apenas em 2013, o que significa arrastar os principais problemas identificados até esta data. Como os prazos de início dos estudos destes projectos já sofreram uma derrapagem, dúvidas se colocam sobre o cumprimento dos prazos estabelecidos, ainda mais quando não há certezas sobre a disponibilização de verbas nacionais para co-financiar os projectos, tendo em conta o contexto de contenção actual.

Considerando a gravidade dos problemas causados pela ETAR de Alcanena para as populações e o ambiente, o deputado José Gusmão e a deputada Rita Calvário do Bloco de Esquerda solicitam uma audiência com o Secretário de Estado do Ambiente, com a finalidade de obter esclarecimentos sobre os investimentos previstos para a reabilitação do sistema de tratamento, as soluções escolhidas, o cumprimento de prazos, e as garantias que os mesmos oferecem para resolver o passivo ambiental existente, os focos de contaminação dos recursos hídricos e solo, os maus cheiros e qualidade do ar respirado pelas populações deste concelho. Seria de todo útil que o presidente ou representantes da ARH-Tejo estivessem presentes nesta audiência.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2010.

A Deputada O Deputado

Rita Calvário José Gusmão

Direito a não respirar “podre” – SIM ou NÃO?





No passado domingo, dia 12 de Dezembro, no Auditório Municipal de Alcanena, realizou-se uma conferência, dinamizada pelo Bloco de Esquerda, sobre a poluição em Alcanena.
Esta sessão reuniu um grupo de ‘preocupados’, que primeiramente ouviram as exposições de especialistas sobre o assunto e, no final, trocaram experiências e pontos de vista, baseados na própria vivência, bem como em conhecimentos técnicos e científicos.
Ficou bem patente que se trata de um grave problema de há muito sentido, mas também desvalorizado, do qual até ao momento não se conhecem as verdadeiras implicações para a saúde pública, mas que transtorna a vida de todos os que vivem e trabalham no concelho, tornando desagradável e doentio o seu dia a dia.
Ficou também claro que o Bloco de Esquerda, aliado desta causa, não abandonará a luta, que será levada até onde os direitos das pessoas o exigirem.

Comunicado de Imprensa

Leia em baixo o Comunicado de Imprensa de 3 de Dezembro do Bloco de Esquerda em Alcanena.

Clique aqui para ler

Reclamamos o DIREITO A RESPIRAR

Bloco de Esquerda continua na senda de uma solução para o grave problema de poluição ambiental em Alcanena



Na passada sexta-feira, dia doze de Novembro, uma delegação, composta pelo Deputado do Bloco de Esquerda pelo Distrito de Santarém, José Gusmão, e mais dois elementos do Bloco, foi recebida pela administração da Austra, no sentido de esclarecer alguns pontos relativos ao funcionamento da ETAR e à poluição que de há muito tem afectado Alcanena, com acrescida intensidade nos últimos tempos.

O Bloco de Esquerda apresentou já um requerimento ao Ministério do Ambiente, aguardando resposta.

Após a reunião com a administração da Austra, realizou-se na Sede do Bloco em Alcanena uma Conferência de Imprensa para fazer o ponto da situação.

Da auscultação da Austra, ficou claro para o Bloco de Esquerda que a ETAR de Alcanena não reúne as condições minimamente exigíveis, quer do ponto de vista do cumprimento da lei, quer da garantia de índices de qualidade do ar compatíveis com a saúde pública e o bem estar das populações.

A delegação do Bloco de Esquerda obteve do presidente da Austra o compromisso da realização de operações de monitorização da qualidade do ar em Alcanena, a realizar o mais tardar em Janeiro. De qualquer forma, o Bloco de Esquerda envidará esforços para que essa monitorização ocorra de forma imediata.

Embora existam planos para a total requalificação dos sistemas de despoluição, registamos com preocupação a incerteza sobre os financiamentos, quer nacional quer comunitário. O Bloco de Esquerda opor-se-á a que estes investimentos possam ser comprometidos por restrições orçamentais, e exigirá junto do Governo garantias a este respeito.

A participação popular foi e continuará a ser um factor decisivo para o acompanhamento e controlo da efectiva resolução do problema da qualidade do ar em Alcanena.

No âmbito da visita do Deputado do Bloco de Esquerda, José Gusmão, ao Concelho de Alcanena, realizou-se um jantar-convívio no Restaurante Mula Russa em Alcanena, ocasião também aproveitada para dialogar sobre assuntos inerentes ao Concelho. Mais tarde, José Gusmão, conviveu com um grupo de jovens simpatizantes num bar deste concelho.

No sábado, dia treze de Novembro, José Gusmão e outros elementos do Bloco de Esquerda estiveram em Minde, no Mercado Municipal, distribuindo jornais do Bloco, ouvindo e conversando com as pessoas.

Neste mesmo dia, junto ao Intermarché de Alcanena, José Gusmão contactou com as pessoas e entregou jornais do Bloco de Esquerda.

Num almoço realizado em Minde, no Restaurante Vedor, com um grupo de aderentes e simpatizantes do Bloco, houve mais uma vez oportunidade para ouvir opiniões, experiências e expectativas, bem como de exprimir pontos de vista.

O Bloco de Esquerda continuará a luta por um direito que parece ser inerente à própria condição humana, mas que vem sendo negado às pessoas que vivem e trabalham em Alcanena – o direito de respirar ar “respirável” e de não ser posta em causa a sua saúde.


A Coordenadora do Bloco de Esquerda de Alcanena

Poluição em Alcanena: Requerimento à Assembleia da República

Pessoas esclarecidas conhecem o seu direito de respirar ar puro e lutam pela sua reconquista já que alguns até isto usurparam.

O Bloco de Esquerda encetou a luta pela despoluição de Alcanena na legislatura anterior e continuará a manifestar-se e a rebelar-se contra esta desagradável e injusta situação até que no nosso concelho possamos respirar de novo.


Veja aqui Requerimento apresentado pelo BE quanto à questão da poluição em Alcanena

Carta à AUSTRA

Carta entregue pelo grupo de cidadãos "Chega de mau cheiro em Alcanena" ao Presidente da Austra e Presidente da Câmara Municipal de Alcanena

INAUGURAÇÃO DA SEDE DO BLOCO DE ESQUERDA EM ALCANENA

Francisco Louçã inaugurou no passado domingo, dia 31 de Outubro, a Sede do Bloco de Esquerda em Alcanena. Na inauguração esteve também representada a Coordenação Distrital do Partido; estiveram presentes aderentes e convidados. Esta ocasião especial foi uma oportunidade de convívio, acompanhada de um pequeno beberete.
Francisco Louçã falou, como sempre, de forma clara e apelativa, abordando a actual situação crítica do país,apontando as razões, propondo alternativas e caminhos.
Baseando-se no Socialismo Democrático, o Bloco de Esquerda tem sido sempre activo na defesa dos valores da verdadeira Democracia, e propõe-se continuar essa luta. Esta nova Sede é mais um ponto de encontro, de trabalho, de partilha de pontos de vista e de tomada de iniciativas, possibilitando que se ouçam as vozes de todas as pessoas e transmitindo os seus problemas e expectativas.
Trata-se de um pequeno espaço, que representa uma grande vontade de mudança e que espera contar com a presença de todos os que partilhem os ideais de um concelho mais próspero, de uma sociedade mais justa e equilibrada, de um país realmente mais avançado.