Enquanto as tensões entre Pequim e Tóquio dão poucos sinais de cederem, muitos temem que, como a China superou o Japão como segunda maior potência mundial, se intensifiquem as suas ambições de unificação mediante a reclamação de territórios perdidos.
Alguns, inclusive, dizem que o restabelecimento de uma ordem internacional onde a China ganhe supremacia na região – e além dela – está na agenda de Pequim. Um artigo publicado em Outubro na edição online da revista norte-americana Foreign Policy afirma que Pequim abandonou a sua filosofia de “auge pacífico”. Sugeriu que a China está voltando a uma perspectiva sino-cêntrica do mundo, colocando-se no ponto mais alto da hierarquia política e vendo outros Estados soberanos como entidades inferiores.
A intranquilidade pelo ressurgimento dessa mentalidade na elite governante do país ficou exposta inclusive em meios de comunicação nacionalistas como o jornal Global Times, da China. “O êxito chinês é o resultado da reforma e da abertura, mas não acarretou uma mentalidade mais aberta. Pelo contrário, causou o regresso de uma ideologia centrada em sim mesma”, disse um artigo de opinião publicado no dia 11.
“As culturas que rodeiam a China historicamente preocuparam-se em ficar sepultadas por outras civilizações poderosas. Agora, sentem-se incomodadas diante (...) da excessiva ênfase da China em sua própria civilização”, afirmava o artigo. Em Setembro, o mesmo jornal declarou que as reclamações da China perante a prefeitura de Okinawa sobre as disputadas Ilhas Senkaku (Diaoyu, em chinês) são parte de uma reclamação mais ampla, que sustenta que o Japão as arrebatou da dinastia Qing (no poder entre 1644 e 1912).
Em Setembro, quando eclodiram as disputas sobre essas ilhas entre China e Japão, Pequim cancelou reuniões diplomáticas com Tóquio. Também cessou a exportação de alguns materiais dos quais o Japão depende, e reclamou uma desculpa depois que Tóquio cedeu às suas exigências e libertou os detidos tripulantes de uma embarcação chinesa dedicada à pesca de arrastão.
Pequim também reagiu com fúria às declarações do ministro dos Negócios Estrangeiros japonês, que descreveram a sua represália como “histérica”. A ira chinesa ficou palpável quando, no começo deste ano, os Estados Unidos enfrentaram as suas reclamações sobre os territórios do Mar da China Meridional argumentando que se tratava de uma área marítima comum.
Numa reunião sobre segurança da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), realizada em Julho, a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, enfatizou a importância de o seu país aderir à liberdade de navegação no Mar da China Meridional, por considerá-lo um “interesse nacional”.
Nessas vias marítimas internacionais há pequenas ilhas, como as Spratly e as Paracel, que são reivindicadas, total ou parcialmente, por não menos de seis países. O ministro dos Negócios Estrangeiros japonês, Yang Jiechi, respondeu que Pequim considera o Mar da China Meridional “um interesse nacional central” e que a “China é um país grande, e outros países são pequenos, e isso é simplesmente um facto”.
A maior parte das recentes disputas territoriais da China tem por objecto o mar, o que ilustra a nova campanha do país para aumentar o seu espaço para o desenvolvimento, bem como obter novos recursos energéticos e minerais.
Em Agosto, Pequim anunciou que enviara um submarino tripulado para as profundidades do Mar da China Meridional para instalar a bandeira chinesa no seu leito e assim iniciar a busca de valiosos depósitos de minerais. Acredita-se que as ilhas Senkaku/Diaoyu também estão localizadas sobre depósitos submarinos de gás natural. Não parece mera coincidência.
A ênfase chinesa nos direitos sobre o mar não é nova e data da época do arquitecto da reforma económica, Deng Xiaoping (1904-1997). Ao contrário de Mao Zedong (1893-1976), que travou guerras pela terra com países vizinhos, Deng destacou a importância da soberania chinesa e dos direitos marítimos.
Enquanto a economia chinesa cresce em ritmo acelerado, pressionando os recursos e os fornecimentos energéticos do país, a exploração marinha e o desenvolvimento assumem nova urgência. Nos últimos anos, a China tomou medidas para fortalecer a sua defesa marítima e contar com uma moderna guarda costeira, paralela à dos Estados Unidos e do Japão.
Do ponto de vista de Pequim, a escalada de recentes disputas territoriais deve-se totalmente ao facto de os Estados Unidos voltarem a envolver-se, com um alto perfil, na região. Em Setembro, o presidente Barack Obama organizou uma cimeira com os dez membros da Asean e comprometeu-se no sentido de o seu país ter um “papel de liderança na Ásia”. Alguns já alertam que o ressurgimento dos Estados Unidos na região despojará a Asean da sua própria voz. Espera-se que a quinta Cimeira da Ásia Oriental convide os líderes da Rússia e dos Estados Unidos a participar dela a partir de 2011.
Para Pequim, essas boas-vindas às “grandes potências” busca contrapor-se ao auge da China. “Washington tenta semear desconfiança entre a China e a Asean”, disse Ma Ying, do Instituto de Xangai para os Estudos Internacionais, alertando que a região pode ficar novamente envolvida na batalha entre as duas superpotências pela influência na área.
28/10/2010
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