segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O défice ambiental do produtivismo

A constatação da insustentabilidade endémica do capitalismo leva-nos então a defender uma evolução para o socialismo. Mas substituir a voracidade do mercado pela planificação da produção não resolve, por si só, o dilema ecológico.
Num momento em que se fala tanto no défice orçamental, apetece-me falar antes de um défice ignorado pela contabilidade: o ambiental. Desde 1987 que a pegada ecológica da actividade produtiva excede um planeta, ou seja, os recursos do planeta tornaram-se insuficientes para sustentá-la. A pegada ecológica global tem continuado a crescer desde então, atingindo hoje 1,4 planetas. Estamos a usar, portanto, mais recursos que os disponibilizados pelo planeta em que vivemos, deixando para as gerações futuras um mundo mais degradado.
Este desequilíbrio tem sido possível, em grande parte, pelo agravamento das desigualdades no acesso aos recursos. Actualmente, os países ricos são capazes de importar dos países pobres os recursos de que necessitam, ao mesmo tempo que exportam grande parte da poluição. A prosperidade material de que gozam os cidadãos europeus acima do limiar da pobreza (incluindo a "classe social" que vive dos negócios low cost) tem a sua cruel contrapartida em cidades como Linfen, China ou Sukinda, Índia, onde se produzem bens baratos usando mão-de-obra quase-escrava e ignorando princípios básicos de sustentabilidade ambiental. Alguns dos poluentes desconhecem fronteiras e acabam por provocar problemas globais, como as alterações climáticas, mas mesmo nestes casos a catástrofe tem sido adiada pelo facto de dois terços da população mundial ter sido atirada para a pobreza e, consequentemente ter um nível de consumo muito reduzido.
Indicadores como a pegada ecológica mostram claramente que o problema não está meramente na injusta distribuição de recursos, contudo. Mesmo com uma distribuição mais justa, continuaríamos a ter provavelmente um sistema produtivo insustentável. Do que se trata, portanto, é de produzir menos.
Esta é uma mensagem que desagrada particularmente os defensores do "capitalismo verde", os quais se escudam no mito da eco-eficiência para negar a existência de limites para o crescimento. Mas a ideia de que podemos continuar a produzir cada vez mais enquanto usamos cada vez menos recursos esbarra em regularidades empíricas incontornáveis. Um exemplo é o do paradoxo da eficiência, que nos diz que, quando usamos um recurso de forma mais eficiente, o custo de usar o recurso é reduzido, o que dá um incentivo para o usar em maior quantidade. Se, por exemplo, alguém trocar o seu automóvel por outro mais eficiente, gastará menos dinheiro em gasolina para percorrer a mesma distância, logo terá a tendência para usar o automóvel mais frequentemente. Este paradoxo foi já extensamente documentado, explicando em parte porque o uso de recursos nas sociedades industrializadas não tem diminuído e até tem aumentado, apesar do contínuo aumento da eficiência.
Outra explicação mais política e menos técnica para este paradoxo pode ser encontrada no próprio funcionamento do sistema capitalista, na medida em que a sua subsistência depende do aumento contínuo do consumo (e da produção). Nenhuma empresa pode sobreviver num mercado livre sem um constante aumento dos seus lucros, o que obriga ao planeamento de campanhas de marketing e publicidade que criem a procura para a sua produção crescente. Assim, mesmo que uma ambiciosa campanha de isolamento de edifícios conduzisse a uma redução considerável no respectivo consumo de energia, o dinheiro poupado seria, na sua maioria, de novo reinvestido na economia, alimentando um aumento da produção e um consequente aumento no uso de recursos. Numa sociedade cada vez mais consumista, a eficácia ambiental de qualquer medida promotora da eficiência será cada vez mais limitada.
A constatação da insustentabilidade endémica do capitalismo leva-nos então a defender uma evolução para o socialismo. Mas substituir a voracidade do mercado pela planificação da produção não resolve, por si só, o dilema ecológico. O exemplo trágico da degeneração da URSS demonstra-o claramente.
Entre 1917 e 1920, período de consolidação da Revolução Russa, foram criadas várias leis ambientais extremamente ambiciosas para a época. O governo de Lenine postulava que nenhuma actividade produtiva deveria prosseguir caso o impacto ambiental fosse fortemente negativo. O mesmo governo criou também, em 1920, a primeira reserva natural do mundo. Mas, pouco tempo depois, os princípios ecológicos foram deixados de lado, seguindo a ideia de que o socialismo implicava uma grande expansão das forças produtivas.
Logo a partir de 1920, a prioridade do governo soviético era a de investir num processo de industrialização que permitisse, em pouco tempo, garantir a todo/a o/a cidadão/ã da URSS um nível de consumo semelhante ao dos EUA. Inerente a este projecto estava a ideia de que a melhor forma de afirmar a superioridade do socialismo face ao capitalismo seria dar a cada família soviética um carro, uma televisão, uma casa de férias e todos os bens materiais que a classe média dos países industrializados tinham. Não era tarefa fácil, tendo em conta o baixíssimo nível de desenvolvimento das forças produtivas num país que tinha acabado de sair de uma monarquia feudal.
O resto da história é sobejamente conhecida. Em nome do aumento da produção, restringiram-se os direitos dos trabalhadores/as, colocaram-se os sindicatos sob o domínio do governo, expandiram-se as diferenças salariais e criaram-se problemas ambientais gravíssimos. Qualquer perturbação social resultante da crescente discrepância entre a realidade da URSS e o ideal da revolução era resolvida com a repressão sanguinária de uma oligarquia que controlava o Estado e o aparelho produtivo.
O socialismo contemporâneo tem de saber retirar as devidas ilações desta experiência, assim como da ciência que aponta para a contradição inerente ao crescimento contínuo da produção num planeta finito1. A alternativa à selvajaria do capitalismo que atravessamos hoje, que destrói as bases de sobrevivência da própria humanidade, tem de ser pós-produtivista, isto é, tem de rejeitar o mito da proporcionalidade entre felicidade humana e nível de consumo. De pouco nos valerá ter uma sociedade igualitária, sem pobreza ou desemprego, se continuarmos a consumir recursos naturais como se fossem infinitos, pois estaremos a promover a igualdade intra-geracional à custa da desigualdade inter-geracional.
Surge então a necessidade de construir o eco-socialismo, invertendo a ordem de prioridades de forma a retirar do centro da actividade política discussões estéreis sobre variações de 0,1% no PIB (um indicador que contabiliza apenas o que é transaccionado no mercado) e colocar no seu lugar o aumento do emprego, a melhoria das relações sociais, o desenvolvimento da cultura, da ciência e da educação e tudo o que contribui para o nosso bem-estar. Apenas a planificação democrática da economia de acordo com os limites naturais pode assegurar a conciliação entre pleno emprego, justiça social e sustentabilidade ambiental.
As sociedades industrializadas contraíram uma enorme dívida ecológica para com as sociedades mais pobres de hoje e as gerações futuras. Está na altura de começar a pagá-la.
1 Ver os dados do relatório "Prosperity Without Growth", realizado pela Comissão de Desenvolvimento Sustentável britânica, em: http://www.sd-commission.org.uk/publications.php?id=914

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Comunicado do Bloco de Esquerda sobre a Escola EB2,3 de Minde

Consulte no link abaixo:

Requerimento ao Secretário de Estado do Ambiente

Bloco requereu a vinda do Secretário de Estado do Ambiente

à AR para esclarecer funcionamento da ETAR de Alcanena

O deficiente funcionamento da Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de Alcanena, com mais de 20 anos, tem sido extremamente penalizador para a qualidade de vida e saúde pública das populações deste concelho, além de ser responsável pela poluição de recursos hídricos e solos.

Esta ETAR, destinada a tratar os efluentes da indústria de curtumes, foi desde a sua origem mal concebida, a começar por se situar em leito de cheia. Desde então os problemas são conhecidos e persistem: maus cheiros intensos; incumprimento regular dos valores-limite estabelecidos para o azoto e CQO das descargas de efluente tratado em meio hídrico; célula de lamas não estabilizadas, com deficiente selagem e drenagem de lixiviados e biogás; redes de saneamento corroídas, com fugas de efluentes não tratados para o ambiente; saturação da ETAR devido a escoamento das águas pluviais ser feita nas redes de saneamento.

Desde há muito que estes problemas são conhecidos e nada justifica, ainda mais com todo o avanço tecnológico existente ao nível do funcionamento das ETAR, que se chegue ao final de 2010 com esta situação. E pior se compreende quando é o próprio Ministério do Ambiente a constatar que gastou ao longo dos anos cerca de 50 milhões de euros para tentar responder a estes problemas.

Em Junho de 2009 foi assinado um protocolo para a reabilitação do sistema de tratamento de águas residuais de Alcanena pela ARH Tejo, o INAG, a Câmara Municipal e a AUSTRA (gestora da ETAR), com investimentos na ordem dos 21 milhões de euros de comparticipação comunitária.

Este protocolo inclui cinco projectos, os mais importantes dos quais com prazo final apenas em 2013, o que significa arrastar os principais problemas identificados até esta data. Como os prazos de início dos estudos destes projectos já sofreram uma derrapagem, dúvidas se colocam sobre o cumprimento dos prazos estabelecidos, ainda mais quando não há certezas sobre a disponibilização de verbas nacionais para co-financiar os projectos, tendo em conta o contexto de contenção actual.

Considerando a gravidade dos problemas causados pela ETAR de Alcanena para as populações e o ambiente, o deputado José Gusmão e a deputada Rita Calvário do Bloco de Esquerda solicitam uma audiência com o Secretário de Estado do Ambiente, com a finalidade de obter esclarecimentos sobre os investimentos previstos para a reabilitação do sistema de tratamento, as soluções escolhidas, o cumprimento de prazos, e as garantias que os mesmos oferecem para resolver o passivo ambiental existente, os focos de contaminação dos recursos hídricos e solo, os maus cheiros e qualidade do ar respirado pelas populações deste concelho. Seria de todo útil que o presidente ou representantes da ARH-Tejo estivessem presentes nesta audiência.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2010.

A Deputada O Deputado

Rita Calvário José Gusmão

Direito a não respirar “podre” – SIM ou NÃO?





No passado domingo, dia 12 de Dezembro, no Auditório Municipal de Alcanena, realizou-se uma conferência, dinamizada pelo Bloco de Esquerda, sobre a poluição em Alcanena.
Esta sessão reuniu um grupo de ‘preocupados’, que primeiramente ouviram as exposições de especialistas sobre o assunto e, no final, trocaram experiências e pontos de vista, baseados na própria vivência, bem como em conhecimentos técnicos e científicos.
Ficou bem patente que se trata de um grave problema de há muito sentido, mas também desvalorizado, do qual até ao momento não se conhecem as verdadeiras implicações para a saúde pública, mas que transtorna a vida de todos os que vivem e trabalham no concelho, tornando desagradável e doentio o seu dia a dia.
Ficou também claro que o Bloco de Esquerda, aliado desta causa, não abandonará a luta, que será levada até onde os direitos das pessoas o exigirem.

Comunicado de Imprensa

Leia em baixo o Comunicado de Imprensa de 3 de Dezembro do Bloco de Esquerda em Alcanena.

Clique aqui para ler

Reclamamos o DIREITO A RESPIRAR

Bloco de Esquerda continua na senda de uma solução para o grave problema de poluição ambiental em Alcanena



Na passada sexta-feira, dia doze de Novembro, uma delegação, composta pelo Deputado do Bloco de Esquerda pelo Distrito de Santarém, José Gusmão, e mais dois elementos do Bloco, foi recebida pela administração da Austra, no sentido de esclarecer alguns pontos relativos ao funcionamento da ETAR e à poluição que de há muito tem afectado Alcanena, com acrescida intensidade nos últimos tempos.

O Bloco de Esquerda apresentou já um requerimento ao Ministério do Ambiente, aguardando resposta.

Após a reunião com a administração da Austra, realizou-se na Sede do Bloco em Alcanena uma Conferência de Imprensa para fazer o ponto da situação.

Da auscultação da Austra, ficou claro para o Bloco de Esquerda que a ETAR de Alcanena não reúne as condições minimamente exigíveis, quer do ponto de vista do cumprimento da lei, quer da garantia de índices de qualidade do ar compatíveis com a saúde pública e o bem estar das populações.

A delegação do Bloco de Esquerda obteve do presidente da Austra o compromisso da realização de operações de monitorização da qualidade do ar em Alcanena, a realizar o mais tardar em Janeiro. De qualquer forma, o Bloco de Esquerda envidará esforços para que essa monitorização ocorra de forma imediata.

Embora existam planos para a total requalificação dos sistemas de despoluição, registamos com preocupação a incerteza sobre os financiamentos, quer nacional quer comunitário. O Bloco de Esquerda opor-se-á a que estes investimentos possam ser comprometidos por restrições orçamentais, e exigirá junto do Governo garantias a este respeito.

A participação popular foi e continuará a ser um factor decisivo para o acompanhamento e controlo da efectiva resolução do problema da qualidade do ar em Alcanena.

No âmbito da visita do Deputado do Bloco de Esquerda, José Gusmão, ao Concelho de Alcanena, realizou-se um jantar-convívio no Restaurante Mula Russa em Alcanena, ocasião também aproveitada para dialogar sobre assuntos inerentes ao Concelho. Mais tarde, José Gusmão, conviveu com um grupo de jovens simpatizantes num bar deste concelho.

No sábado, dia treze de Novembro, José Gusmão e outros elementos do Bloco de Esquerda estiveram em Minde, no Mercado Municipal, distribuindo jornais do Bloco, ouvindo e conversando com as pessoas.

Neste mesmo dia, junto ao Intermarché de Alcanena, José Gusmão contactou com as pessoas e entregou jornais do Bloco de Esquerda.

Num almoço realizado em Minde, no Restaurante Vedor, com um grupo de aderentes e simpatizantes do Bloco, houve mais uma vez oportunidade para ouvir opiniões, experiências e expectativas, bem como de exprimir pontos de vista.

O Bloco de Esquerda continuará a luta por um direito que parece ser inerente à própria condição humana, mas que vem sendo negado às pessoas que vivem e trabalham em Alcanena – o direito de respirar ar “respirável” e de não ser posta em causa a sua saúde.


A Coordenadora do Bloco de Esquerda de Alcanena

Poluição em Alcanena: Requerimento à Assembleia da República

Pessoas esclarecidas conhecem o seu direito de respirar ar puro e lutam pela sua reconquista já que alguns até isto usurparam.

O Bloco de Esquerda encetou a luta pela despoluição de Alcanena na legislatura anterior e continuará a manifestar-se e a rebelar-se contra esta desagradável e injusta situação até que no nosso concelho possamos respirar de novo.


Veja aqui Requerimento apresentado pelo BE quanto à questão da poluição em Alcanena

Carta à AUSTRA

Carta entregue pelo grupo de cidadãos "Chega de mau cheiro em Alcanena" ao Presidente da Austra e Presidente da Câmara Municipal de Alcanena

INAUGURAÇÃO DA SEDE DO BLOCO DE ESQUERDA EM ALCANENA

Francisco Louçã inaugurou no passado domingo, dia 31 de Outubro, a Sede do Bloco de Esquerda em Alcanena. Na inauguração esteve também representada a Coordenação Distrital do Partido; estiveram presentes aderentes e convidados. Esta ocasião especial foi uma oportunidade de convívio, acompanhada de um pequeno beberete.
Francisco Louçã falou, como sempre, de forma clara e apelativa, abordando a actual situação crítica do país,apontando as razões, propondo alternativas e caminhos.
Baseando-se no Socialismo Democrático, o Bloco de Esquerda tem sido sempre activo na defesa dos valores da verdadeira Democracia, e propõe-se continuar essa luta. Esta nova Sede é mais um ponto de encontro, de trabalho, de partilha de pontos de vista e de tomada de iniciativas, possibilitando que se ouçam as vozes de todas as pessoas e transmitindo os seus problemas e expectativas.
Trata-se de um pequeno espaço, que representa uma grande vontade de mudança e que espera contar com a presença de todos os que partilhem os ideais de um concelho mais próspero, de uma sociedade mais justa e equilibrada, de um país realmente mais avançado.